"A sempre inteligente artista, Diana Damrau, sabe como suavizar sua voz para criar aquela distintiva voz de soprano exigida pela operetta, um tom leve e brilhante, de coloratura ágil, fluída e narrativa que é condição sine qua non de um bom estilo de chanson. Kaufmann, na verdade, participa de apenas três faixas, mas é extraordinário" (Resenha da BBC Music Magazine de fevereiro de 2024)
"A clareza natural e a doçura da voz de soprano de Diana Damrau é um grande trunfo nessa gravação. Os resultados tocam o coração além de deleitar o paladar. Ainda é cedo, mas me pergunto se já encontrei meu disco favorito do ano?" (Resenha da Gramophone de janeiro de 2024)
"Para mim, a operetta é o gênero mais abrangente do teatro musical. Sua indulgência, seu anseio, sua alegria e sua comédia tocam o coração e mostram o lado positivo da vida. Raramente deixa de exercer sua magia sobre o público" (Diana Damrau sobre operettas)
Review
Diana Damrau é conhecida por seu Mozart, Salieri, Strauss e por sua excelência no belcanto italiano, de modo que um álbum inteiramente dedicado a árias de operettas surge como uma novidade em sua já laureada discografia. E não se trata de quaisquer árias, a soprano alemã confessou que durante o período de pandemia de covid se reaproximou de Elke Kottmair, uma profunda conhecedora do gênero de operettas, e que teve papel primordial na escolha do repertório, que foge da obviedade dos grandes sucessos da operetta como discutiremos mais a frente.
Desde a infância a cantora confessa ser apaixonada pelas operettas, esse gênero do final do século XIX em que elementos de comédia e dança tem grande destaque, sendo conhecida pela sua acessibilidade junto ao público, muito por conta das melodias cativante e humorísticas. Damrau ouvia operettas em rádios e programas populares, o apelido de sua mãe, Rosalinde, é em homenagem a personagem de Die Fledermaus.
Esse é um álbum focado na alegria, tanto a da interprete quanto a que ela pretende transmitir para o ouvinte. Damrau, montou seu repertório para prestigiar não apenas a operetta vienense, mas também para incluir operettas de Paris e Berlim. Para a cantora na operetta berlinense há muito mais recitação e elementos de "chanson", ao passo que a operetta parisiense é onde o gênero se originou pelas mãos de Jacques Offenbach.
Para fins de divisão podemos considerar:
Viena: Robert Stolz, Franz Lehár, Erich Wolfgang Korngold, Johan Strauss I, Emmerich Kálmán, Ralph Benatzky, Carl Millöcker, Oscar Straus, Richard Heuberger, Johan Stauss II,
Berlim: Paul Lincke, Paul Abraham
Paris: Francis Lopez, Henri Christiné, André Messager
É uma viagem por mais de sete décadas de história das operettas com a participação de alguns "cameos" estrelados que apenas complementam os deslumbrantes vocais e a sagacidade humorística de Diana Damrau.
O disco abre em grande estilo com a ária "Du sollst der Kaiser meiner Seele sein" (de Der Favorit) de Robert Stolz, uma das minhas favoritas do álbum, em que a Diana Damrau dá o tom alegre que irá nos acompanhar por toda esse recital, é simplesmente lindo.
Logo depois saltamos direto para a operetta berlinense de Paul Lincke, o pai da operetta de Berlim, com a ária de sua conhecida ópera, Frau Luna, uma belíssima valsa, seguida também por outra valsa de Franz Lehár "Wär es auch nichts als ein Traum vom Glück" da operetta Eva, momentos onde Damrau mostra seu toque delicado, ao mesmo tempo que demonstra facilidade em manter a melodia flutuando nos momentos de ápice da orquestra.
Os elementos de jazz podem ser percebidos em "Flirt-Duett. "Ein kleiner Flirt" de Das Lied der Liebe composta por Korngold, que marca a primeira aparição de Jonas Kaufmann no álbum em dueto estrelado e é incrível constatar como a voz de bronze de Kaufmann complementa perfeitamente a leveza lírica trazida por Damrau.
Mais jazz vem na mais que interessante "In meinen weißen Armen" (de Ball Im Savoy) de Paul Abraham conhecido pela sua habilidade de introduzir interlúdios de jazz nas operettas, para além de elementos de dança latinos como tango e pasodoble, que lhe renderam uma perseguição brutal dos nazistas que consideravam sua arte como degenerada pelo fusionismo desses elementos. A seleção dessa ária para compor o programa demonstra o bom gosto e a sensibilidade de Diana Damrau, aumentando o valor desse recital.
Os outros dois duetos com Jonas Kaufmann em composições de Ralph Benatzky e Robert Stolz, "Im weißen Rößl: "Mein Liebeslied muss ein Walzer sein" e Richard Heuberger, "Gehen wir ins Chambre séparée" (da operetta: Der Opernball) são pontos altos do álbum, o último inclusive mostra uma química romântica entre os dois interpretes, simplesmente deliciosa.
Outros destaque, ao meu ver, são as árias seguintes de Franz Lehár, foi muito inteligente da parte de Diana Damrau na escolha do repertório com Elke Kottmair abordar esse "lado b" do compositor, o que só evidencia o seu talento melódico.
Falando em Elke Kottmair, ela faz uma pequena aparição no disco em conjunto com a mezzosoprano, Emily Sierra, em "Wo die wilde Rose erblüht" (de Das Spitzentuch der Königin) de Johan Strauss II, um belo ensemble de vocais femininos.
A seleção também é muito feliz ao nos apresentar as operettas francesas, tão pouco faladas, eu particularmente gosto da alegria e delicadeza que ela empresta a ária "Rossignol" de André Messager, uma prova da habilidade e clareza dos vocais de Diana Damrau, que fecha com um maravilhoso sobre agudo. Esse talento se repete na "Ça fait tourner la tête", ária composta por Francis Lopez que traz um tempero espanhol para a tradicional valsa, Presto Music brinca no seu review que o drink de escolha dessa canção é uma sangria no lugar do habitual champagne.
Diana Damrau chegou num ponto da carreira em que retém todas as habilidades de uma soprano lírico ligeiro que atravessa facilmente qualquer desafio de agilidade que as árias possam impor, quanto pela sua madureza, também é capaz de escurecer e apertar a voz para momentos de maior expressividade dramática, em suma um instrumento perfeito para Operettas.
Esse registro merece todos os elogios, pois além de mostrar Diana Damrau no auge de suas capacidades vocais, é uma seleção que apresenta muito mais que o trivial em matéria de operetta, sendo focado em uma pesquisa cuidadosa de obras pouco conhecidas que são interpretadas aqui em altíssimo nível pelos vocais de Diana Damrau.
Nesse ponto da carreira, sendo uma das sopranos mais celebradas de sua geração, Diana Damrau poderia se acomodar com repertório arroz de festa de operettas, mas pela sua ousadia, brilho vocal, trabalho de pesquisa e importância histórica, para além da perfeita escolha de colaboradores, esse trabalho merece toda exaltação.
Como explícito na ária que fecha o disco, "Ich bin eine Frau, die weiß, was sie will" de Oscar Straus, Diana Damrau assim como a protagonista da ópera sabe muito o que quer e isso fica evidente ao ouvir o disco por completo.
Bibliografia
Resenha de Richard Bratby para a revista Gramophone: https://www.gramophone.co.uk/reviews/review?slug=diana-damrau-operette-wien-berlin-paris
Indicação do álbum no Editors Choice de Janeiro de 2024 pela revista Gramophone: https://www.gramophone.co.uk/features/article/editor-s-choice-january-2024-the-best-new-classical-recordings
Reportagem da Presto Music por Katherine Cooper: https://www.prestomusic.com/classical/articles/5673--recording-of-the-week-operette-from-diana-damrau
Dados da Presto Music: https://www.prestomusic.com/classical/products/9544155--operette
Review da Financial Times: https://www.ft.com/content/178d2f74-7a0d-477c-b514-9b956b38f792
Entrevistas e declarações de Diana Damrau: https://diana-damrau.com/en/2024/02/08/music-matters-interview/ e https://diana-damrau.com/en/2023/12/20/arte-drei-fragen-an-diana-damrau/ e https://diana-damrau.com/en/2023/12/18/wien-berlin-paris-operettenzauber-mit-diana-damrau/ e https://diana-damrau.com/en/2023/12/14/diana-damrau-in-der-operette-gibt-es-ein-anderes-bild-von-der-frau/